Empregada gestante: O contrato pode ser suspenso durante a pandemia?

Em maio foi publicada a Medida Provisória nº 14.151, que objetiva o afastamento das empregadas gestantes de suas atividades presenciais enquanto durar a pandemia no Brasil.

A Lei, em seu texto, prevê que enquanto perdurar a situação de emergência pública em decorrência do coronavírus, a empregada gestante deverá, obrigatoriamente, ser afastada de seu trabalho presencial, sem prejuízo ao seu salário, ficando as empresas “obrigadas” a alterarem o regime de trabalho de suas empregadas nessas condições para a modalidade de tele trabalho.

Desde sua publicação, a norma tem causado discussões sobre a omissão do legislador em diversos pontos, levando as empresas a questionarem como deverão proceder e adequar os contratos/situação de suas colaboradoras.

Dentre os principais pontos levantados, podemos destacar a impossibilidade de aplicação da medida indicada na Lei para empregadas que trabalham em funções incompatíveis com o tele trabalho. Dito isso, como as empresas devem proceder nesse caso? Elas poderão utilizar os institutos previstos nas MPs 1.045 e 1.046 – que dispõem sobre medidas complementares para o enfrentamento a crise de saúde pública, decorrente do coronavírus – e se resguardarem juridicamente? A resposta para esses questionamentos está presente na própria legislação em comento.

Considerando a omissão da lei nesse ponto, esse tema tem sido considerado por diversos especialistas em Direito do Trabalho, como uma brecha para utilização da mesma lógica jurídica, defendendo que a empresa poderá utilizar as medidas previstas nas MPs, tais como, a suspensão do contrato de trabalho.

Tal compreensão advém de que a Lei 14.151 de 2021, não traz menção, ou seja, não há vedação expressa para que seja adotada a suspensão do contrato de trabalho das empregadas gestantes em caráter temporário.

Adotando essa lógica, considerando as premissas previstas na MP 1.045 de 2021 – que estabelece o Programa Emergencial e trata sobre a redução de salário e suspensão do contrato de trabalho – trazendo em seu texto menção expressa autorizando as empregadas gestantes a adotar tais medidas, vide artigo 13 da referida MP. É notório que as normas instituídas pelo governo federal são conflitantes entre si, pois ora a empregada gestante pode ter seu contrato de trabalho suspenso ou salário reduzido, ora, deve ser mantida em tele trabalho, com a manutenção de seu salário.

Deste modo, havendo omissão na legislação para as empregadas gestantes que possuam cargo incompatível com o home-office (tele trabalho), é possível que seja aplicado pela empresa a suspensão do contrato de trabalho da gestante, sendo observados os aspectos seguintes:

  • Pactuação por meio de acordo escrito, seja individual ou coletivo;
  • Adequação considerando as estabilidades previstas pela legislação vigente (CLT e MPs).
  • A devida complementação (indenização e benefício) para que a colaboradora não sofra redução salarial;

Havendo interesse da empregada em seguir com a suspensão da jornada (firmando o acordo por escrito), deverá existir também a previsão do devido pagamento de cunho indenizatório, garantindo desta forma que receba o mesmo valor líquido que percebia mensalmente de seu empregador, considerando, é claro, o valor complementar que receberá referente ao benefício instituído pelo governo federal BeM – Benefício Emergencial de Preservação do emprego. Pois, desta forma, tem sua renda mantida, sem sofrer prejuízos.

É importante ressaltar que a estabilidade da gestante é subdivida entre a previsão normativa e garantida pela CLT e Súmula do TST, na qual:

  • A empregada gestante tem garantida a estabilidade no emprego, contados do momento em que teve sua gravidez confirmada até cinco meses após o parto e;
  • A previsão garantida pela MP 1.045/21, na qual, além desse período de estabilidade a empregada tem direito a uma garantia provisória no emprego equivalente ao período acordado para suspensão do contrato de trabalho.

De todo o modo, nesses moldes as estabilidades são cumulativas, devendo ser respeitados os prazos a elas vinculados, ou seja, durante os cinco meses após o parto não poderá haver demissão e após esse período irá iniciar a estabilidade da MP 1.045.

Mas e se a empregada se recusar a firmar o acordo para suspensão ou redução, quais são as opções da empresa?

Nesse caso a empresa poderá optar pela:

  • concessão de antecipação de férias de 30 dias, com a devida notificação da empregada com 48 horas de antecedência, respeitando o que se preceitua o artigo  da MP 1046;
  • implementação do banco de horas negativo, se as atividades inerentes ao cargo da gestante não possam ser realizadas em seu domicílio;
  • remanejamento da empregada para realizar outras atividades, considerando uma função compatível com o trabalho à distância, visto que sua atual função a impossibilita de realizar tais atividades à distancia.

Nesse último, é importante destacar que apesar da lei não ser clara nesse quesito, o entendimento majoritário é de que tal pratica é legal e possível, desde que as atividades sejam compatíveis ou relacionadas e que, de nenhuma forma, seja afetado o montante percebido pela empregado como salário.

Para as empresas, a manutenção de suas colaboradoras gestantes em casa,

à disposição, com remuneração integral, acaba gerando um custo altíssimo e a utilização das normas previstas nas MPs 1.045 e 1.046 trás a possibilidade de reduzirem seus custos, enquanto as MPs possuírem validades ou forem convertidas em lei.

Vale lembrar que a vigência da MP é 60 dias, sendo prorrogável por igual período. E no caso de não haver conversão em lei, as medidas acabam por sua vez perdendo a eficácia, sendo devido que o Congresso Nacional elabore decreto legislativo para disciplinar as relações jurídicas decorrentes da MP revogada implicitamente.

A MP 1.045 citada acima, encontra-se em votação pela Câmara de Deputados e será enviada em seguida para votação no Senado.

Destaca-se que havendo perda da eficácia, ou seja, caso perca a validade, a MP produz efeitos imediatos e válidos, para todos os atos praticados durante seu período de vigência.

Por fim, de todo o modo a Lei 14.151/21 foi instituída para beneficiar e resguardar as empregadas gestantes no período em que vivemos. Entretanto, basta uma simples leitura da referida Lei para compreender sua extrema simplicidade e identificar suas diversas lacunas.

Muito embora as alternativas previstas tenham como intuito amenizar as consequências decorrentes da crise instaurada pela pandemia do coronavírus, objetivando a manutenção dos empregos e funcionamento das atividades das empresas, é importante entender que não sendo possível a realização das atividades da empregada em sua residência, é completamente plausível e está dentro da legalidade a empresa que optar por realizar a suspensão, redução ou recolocação da funcionária, uma vez que, a mesma além de ter seu trabalho mantido ainda possui a possibilidade de eventual ajuda de custo através da percepção de benefício emergencial, com o qual manterá a integridade de seu salário.

Ainda ficou com dúvidas?
Clique aqui e entre em contato

fonte: https://www.jusbrasil.com.br